Na saída da prefeitura, o prefeito recém empossado acaba encontrando, casualmente, um de seus eleitores.
- Seu prefeito, ô seu prefeito! (O eleitor faz gestos amplos, já que o prefeito parece ignorá-lo. Vendo que não haverá jeito de sair fingindo não perceber, o prefeito resolve parar e atendê-lo).
- Sim?
- O senhor lembra de mim? O senhor esteve em minha casa há uns quatro meses atrás, pedindo voto!
- Não tenho bem certeza. Quem é o senhor mesmo?
- Ah, doutor, sou o Fulano, lembra? Moro na vila Tal! O senhor esteve lá em casa, tomou chimarrão, conversou bastante comigo, com minha esposa e minhas filhas!
- Ah, sim! Agora lembrei de você! (É claro que o prefeito não lembrava, mas resolveu ser simpático).
- Que alegria, seu prefeito! Agora que o senhor está na prefeitura, a coisa vai pra frente!
- Pois é, agora tudo muda nesta cidade! O povo terá voz e vez! – Responde o prefeito.
- Que bom, seu prefeito! Olha, lá na nossa vila, tá todo mundo feliz, louco para que comece a funcionar a creche nova que o senhor prometeu!
- Ah, sim! (o prefeito tosse, meio sem jeito) Em breve vamos fazer um estudo para ver se há necessidade de construir!
- Fazer um estudo, doutor? Mas o senhor tinha dito que era uma das primeiras coisas que ia fazer!
- Mas as coisas não são tão simples! – responde o prefeito – A prefeitura não está com boas condições financeiras. Temos que economizar!
- Ah, tá bom! Mas falando em situação financeira, doutor, o senhor já baixou o IPTU? A gente ta com o imposto atrasado lá em casa, porque não consegue pagar. A patroa até tá juntando um troquinho para a gente botar tudo em dia!
- Olha, essa estória de IPTU eu não sei como funciona – Confessa o prefeito. – mas vou estudar o caso. Este ano não dá tempo de mudar nada, mas vamos ver nos próximos anos. Quem sabe a gente encontra alguma solução!
- Mas o senhor disse que ia entrar e mudar tudo!
- Olha, as coisas não são assim. Tem que fazer projeto, estudar, conseguir aprovação, fazer um monte de papelada...
- Ah, do jeito que o senhor falou lá em casa, eu achei que era só mandar baixar e pronto! Mas tudo bem. Eu espero. E o emprego de minha filha? Quando ela pode ir lá falar com o senhor?- Quantos anos ela tem? – Pergunta o prefeito.
- Tem 15.
- Então ela não pode trabalhar, seu Fulano! É a lei!
- Mas o senhor disse que ia arrumar pra ela trabalhar numa escola! Salário baixinho, mas que ia ajudar nas despesas da casa! Tenho minha mulher de testemunha, doutor.
- Olha, meu amigo, quando eu fui na sua casa, eu era candidato. Agora que sou prefeito, tudo muda. As coisas são diferentes. Tenho que cumprir as leis. Tenho que fazer projetos. Você não sabe quanta dívida tem nessa prefeitura! E quanta papelada atrasada, quanta máquina quebrada, quanta goteira...
- Mas seu prefeito, o senhor já sabia disso! O senhor mesmo é que me disse que no dia em que entrasse na prefeitura, tudo ia ser diferente! A gente confiou no senhor. A cidade inteira apoiou para o senhor ir para lá e fazer alguma coisa por nós. O senhor prometeu que o que os outros não estavam fazendo ia ser feito!
- Olha, meu amigo. Nestes quatro primeiros anos, a gente vai colocar a casa em ordem. Arrumar tudo, deixar a prefeitura funcionando. Depois, quem sabe, com a ajuda do povo, a gente consegue mais quatro anos para, daí sim, fazer tudo que foi prometido! Agora me dê licença. Tenho uma reunião na Câmara de Vereadores, e já estou atrasado!
O prefeito sai sem nem cumprimentar o homem, que fica cabisbaixo. Nada havia mudado, ele sentiu. Ficou pensando no que iria dizer em casa. No que ia dizer para os vizinhos. Todos ficariam tristes. Puxa, esperar mais quatro anos! E para quê?
O cidadão lembra então que haverá uma reunião na Câmara de Vereadores. Corre para lá. Seu candidato se elegeu vereador e tinha prometido ajudar com a conta de luz, que já estava atrasada. Esse sim era homem de palavra! Tinha até dado um fardo de arroz antes mesmo das eleições!
Chegou em frente ao prédio e viu as portas fechadas. Esperou por mais de uma hora, e ninguém apareceu. Só então se deu conta de que havia sido uma desculpa do prefeito para terminar a conversa. Voltou para casa e não contou nada do ocorrido para a família.
No outro dia, foi à prefeitura. Passou o dia inteiro na sala de espera, mas o prefeito estava numa reunião que, pelo visto, não terminava. Foi mais duas vezes na prefeitura. Não conseguiu nada, ninguém resolveu seus problemas, nem mostrou interesse neles.
Você já viu história parecida? De um candidato que promete “mundos e fundos” e depois não cumpre nada? Que fica culpando as administrações anteriores e diz que, se eleito novamente, vai conseguir fazer tudo o que prometeu da primeira vez e não fez? Que durante as eleições visita e conhece todo mundo e depois está sempre “de reunião”? O seu Fulano começou agora a perceber que entrou numa canoa furada... Logo ele, que havia defendido tanto o candidato! Que tinha participado de carreata, de passeata, de protesto contra a administração que estava trabalhando!
Assim começa a consciência política, quando deixamos de ser inocentes e começamos a perceber que o “tapinha nas costas”, o presente, a conversa fácil, são apenas artifícios de quem quer se colocar no poder. Na maioria dos casos, depois, as coisas continuam como estavam... Ou pioram!
- Seu prefeito, ô seu prefeito! (O eleitor faz gestos amplos, já que o prefeito parece ignorá-lo. Vendo que não haverá jeito de sair fingindo não perceber, o prefeito resolve parar e atendê-lo).
- Sim?
- O senhor lembra de mim? O senhor esteve em minha casa há uns quatro meses atrás, pedindo voto!
- Não tenho bem certeza. Quem é o senhor mesmo?
- Ah, doutor, sou o Fulano, lembra? Moro na vila Tal! O senhor esteve lá em casa, tomou chimarrão, conversou bastante comigo, com minha esposa e minhas filhas!
- Ah, sim! Agora lembrei de você! (É claro que o prefeito não lembrava, mas resolveu ser simpático).
- Que alegria, seu prefeito! Agora que o senhor está na prefeitura, a coisa vai pra frente!
- Pois é, agora tudo muda nesta cidade! O povo terá voz e vez! – Responde o prefeito.
- Que bom, seu prefeito! Olha, lá na nossa vila, tá todo mundo feliz, louco para que comece a funcionar a creche nova que o senhor prometeu!
- Ah, sim! (o prefeito tosse, meio sem jeito) Em breve vamos fazer um estudo para ver se há necessidade de construir!
- Fazer um estudo, doutor? Mas o senhor tinha dito que era uma das primeiras coisas que ia fazer!
- Mas as coisas não são tão simples! – responde o prefeito – A prefeitura não está com boas condições financeiras. Temos que economizar!
- Ah, tá bom! Mas falando em situação financeira, doutor, o senhor já baixou o IPTU? A gente ta com o imposto atrasado lá em casa, porque não consegue pagar. A patroa até tá juntando um troquinho para a gente botar tudo em dia!
- Olha, essa estória de IPTU eu não sei como funciona – Confessa o prefeito. – mas vou estudar o caso. Este ano não dá tempo de mudar nada, mas vamos ver nos próximos anos. Quem sabe a gente encontra alguma solução!
- Mas o senhor disse que ia entrar e mudar tudo!
- Olha, as coisas não são assim. Tem que fazer projeto, estudar, conseguir aprovação, fazer um monte de papelada...
- Ah, do jeito que o senhor falou lá em casa, eu achei que era só mandar baixar e pronto! Mas tudo bem. Eu espero. E o emprego de minha filha? Quando ela pode ir lá falar com o senhor?- Quantos anos ela tem? – Pergunta o prefeito.
- Tem 15.
- Então ela não pode trabalhar, seu Fulano! É a lei!
- Mas o senhor disse que ia arrumar pra ela trabalhar numa escola! Salário baixinho, mas que ia ajudar nas despesas da casa! Tenho minha mulher de testemunha, doutor.
- Olha, meu amigo, quando eu fui na sua casa, eu era candidato. Agora que sou prefeito, tudo muda. As coisas são diferentes. Tenho que cumprir as leis. Tenho que fazer projetos. Você não sabe quanta dívida tem nessa prefeitura! E quanta papelada atrasada, quanta máquina quebrada, quanta goteira...
- Mas seu prefeito, o senhor já sabia disso! O senhor mesmo é que me disse que no dia em que entrasse na prefeitura, tudo ia ser diferente! A gente confiou no senhor. A cidade inteira apoiou para o senhor ir para lá e fazer alguma coisa por nós. O senhor prometeu que o que os outros não estavam fazendo ia ser feito!
- Olha, meu amigo. Nestes quatro primeiros anos, a gente vai colocar a casa em ordem. Arrumar tudo, deixar a prefeitura funcionando. Depois, quem sabe, com a ajuda do povo, a gente consegue mais quatro anos para, daí sim, fazer tudo que foi prometido! Agora me dê licença. Tenho uma reunião na Câmara de Vereadores, e já estou atrasado!
O prefeito sai sem nem cumprimentar o homem, que fica cabisbaixo. Nada havia mudado, ele sentiu. Ficou pensando no que iria dizer em casa. No que ia dizer para os vizinhos. Todos ficariam tristes. Puxa, esperar mais quatro anos! E para quê?
O cidadão lembra então que haverá uma reunião na Câmara de Vereadores. Corre para lá. Seu candidato se elegeu vereador e tinha prometido ajudar com a conta de luz, que já estava atrasada. Esse sim era homem de palavra! Tinha até dado um fardo de arroz antes mesmo das eleições!
Chegou em frente ao prédio e viu as portas fechadas. Esperou por mais de uma hora, e ninguém apareceu. Só então se deu conta de que havia sido uma desculpa do prefeito para terminar a conversa. Voltou para casa e não contou nada do ocorrido para a família.
No outro dia, foi à prefeitura. Passou o dia inteiro na sala de espera, mas o prefeito estava numa reunião que, pelo visto, não terminava. Foi mais duas vezes na prefeitura. Não conseguiu nada, ninguém resolveu seus problemas, nem mostrou interesse neles.
Você já viu história parecida? De um candidato que promete “mundos e fundos” e depois não cumpre nada? Que fica culpando as administrações anteriores e diz que, se eleito novamente, vai conseguir fazer tudo o que prometeu da primeira vez e não fez? Que durante as eleições visita e conhece todo mundo e depois está sempre “de reunião”? O seu Fulano começou agora a perceber que entrou numa canoa furada... Logo ele, que havia defendido tanto o candidato! Que tinha participado de carreata, de passeata, de protesto contra a administração que estava trabalhando!
Assim começa a consciência política, quando deixamos de ser inocentes e começamos a perceber que o “tapinha nas costas”, o presente, a conversa fácil, são apenas artifícios de quem quer se colocar no poder. Na maioria dos casos, depois, as coisas continuam como estavam... Ou pioram!
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